quinta-feira, dezembro 30, 2004   

 

Feliz Ano Novo!

 

O rei chegou
E já mandou tocar os sinos
Na cidade inteira
É pra cantar os hinos
Hastear bandeiras
E eu que sou menino
Muito obediente
Estava indiferente
Logo me comovo
Pra ficar contente
Porque é Ano Novo
Há muito tempo
Que essa minha gente
Vai vivendo a muque
É o mesmo batente
É o mesmo batuque
Já ficou descrente
É sempre o mesmo truque
E que já viu de pé
O mesmo velho ovo
Hoje fica contente
Porque é Ano Novo

A minha nega me pediu um vestido
Novo e colorido
Pra comemorar
Eu disse:
Finja que não está descalça
Dance alguma valsa
Quero ser seu par
E ao meu amigo que não vê mais graça
Todo ano que passa
Só lhe faz chorar
Eu disse:
Homem, tenha seu orgulho
Não faça barulho
O rei não vai gostar

E quem for cego veja de repente
Todo o azul da vida
Quem estiver doente
Saia na corrida
Quem tiver presente
Traga o mais vistoso
Quem tiver juízo
Fique bem ditoso
Quem tiver sorriso
Fique lá na frente
Pois vendo valente
E tão leal seu povo
O rei fica contente
Porque é Ano Novo
- Chico Buarque

 

quarta-feira, dezembro 29, 2004   

 

Adenda às legendas

 

tudo é um ciclo
que se resolve
____________ improvisadamente solto.

 

 

 

 


S. Miguel - Açores (Fevereiro 2002)

 

 

 

 


S. Miguel - Açores (Fevereiro 2002)

 

 

 

 


S. Miguel - Açores (Fevereiro 2002)

 

 

 

post descaradamente ofensivo

 

grande vaca!


São Miguel - Açores (Fevereiro 2002)

 

 

 

'O' presente de natal

 


 

 

 

post perfeitamente dispensável

 

gosto de mergulhar bolachas de água e sal no chá de tília que bebo pela manhã.

 

terça-feira, dezembro 28, 2004   

 

 

Abismo sereno
mergulhar pulsos estreitos
apertados nos dias

deslizar

saber do corpo o
suicídio lento
recrear ossos
movimento visceral
veias espetadas
centro

nós

cruzar descruzar coágulos
aprender

vida

por detrás da cidade
no ser e estar perante as
coisas mortas
obtusos olhares
excrementos impostos e expostos
boca do silêncio
ranger dentes
trincar pedras
alinhando o ar

imenso.

 

 

 

 

Também o deserto vem
do mar. Não sei em que navio,
mas foi desses lugares
que chegaram ao meu jardim
as palmeiras.
Com o sol das areias
em cada folha,
na coroa o sopro
ainda húmido das estrelas
- Eugénio de Andrade

 

segunda-feira, dezembro 27, 2004   

 

:)

 

«Eu vou guardar cada lugar teu
ancorado em cada lugar meu
e hoje apenas isso me faz acreditar
que eu vou chegar contigo
onde só chega quem não tem medo de naufragar.»

- Mafalda Veiga

 

quinta-feira, dezembro 23, 2004   

 

feliz natal

 


©Alfredo Cunha

 

 

 

www.google.com

 

Alguém acabou de chegar a este blog através da pesquisa: 'postais de natal para inimigas.'

B)em-hajas e boa sorte!

 

quarta-feira, dezembro 22, 2004   

 

 

Vilarinho das Furnas - Gerês

Porque não soube merecer a glória, a mais suave
de me deitar a teu lado
e que o sangue a palavra
abolisse a diferença entre o meu corpo e a minha voz
porque te perdi
não sei quem sou
- António Ramos Rosa

 

 

 

 

«(...)
mas gosto da noite e do riso das cinzas. gosto do deserto e do acaso da vida. gosto dos enganos
do acaso e dos encontros inesperados. pernoito quase sempre no lado sagrado do meu coração,
ou onde o medo tem a precaridade doutro corpo,
a dor de todas as ruas vazias.»
- Al Berto

 

 

 

 



I cannot follow you, my love,
you cannot follow me.
I am the distance you put between
all of the moments that we will be.

You know who I am,
you've stared at the sun,
well I am the one who loves
changing from nothing to one.

Sometimes I need you naked,
sometimes I need you wild,
I need you to carry my children in
and I need you to kill a child.

You know who I am,
you've stared at the sun,
well I am the one who loves
changing from nothing to one.

If you should ever track me down
I will surrender there
and I will leave with you one broken man
whom I will teach you to repair.

You know who I am,
you've stared at the sun,
well I am the one who loves
changing from nothing to one.

I cannot follow you, my love,
you cannot follow me.
I am the distance you put between
all of the moments that we will be.

You know who I am...

- Leonard Cohen (Songs From a Room - 1969)

 

terça-feira, dezembro 21, 2004   

 

 

nunca escrevi

sou
apenas um tradutor de silêncios

a vida tatuou-me nos olhos
janelas
em que me transcrevo e apago

sou
um soldado
que se apaixona
pelo inimigo que vai matar

- Mia Couto

 

 

 

 

Devia morrer-se de outra maneira.
Transformarmo-nos em fumo, por exemplo.
Ou em nuvens.
Quando nos sentíssemos cansados, fartos do mesmo sol
a fingir de novo todas as manhãs, convocaríamos
os amigos mais íntimos com um cartão de convite
para o ritual do Grande Desfazer: "Fulano de tal comunica
a V. Exa. que vai transformar-se em nuvem hoje
às 9 horas. Traje de passeio".
E então, solenemente, com passos de reter tempo, fatos
escuros, olhos de lua de cerimónia, viríamos todos assistir
a despedida.
Apertos de mãos quentes. Ternura de calafrio.
"Adeus! Adeus!"
E, pouco a pouco, devagarinho, sem sofrimento,
numa lassidão de arrancar raízes...
(primeiro, os olhos... em seguida, os lábios... depois os cabelos... )
a carne, em vez de apodrecer, começaria a transfigurar-se
em fumo... tão leve... tão subtil... tão pólen...
como aquela nuvem além (vêem?) — nesta tarde de outono
ainda tocada por um vento de lábios azuis...

- José Gomes Ferreira

 

 

 

 

conto-te enrolada nos dentes com
lâmpadas a caírem no silêncio
do teu corpo

abro o meu sono para te lembrar a boca
as narinas no parto do ar
a terra contra a árvore onde
nasces a pronunciar parede nesta
lisura que se perde sem qualquer rebordo

pulso-te na interrogação na
frase de nenhuma escrita
testemunho-me na aridez soletro demais
e tu estalas-te no rebentamento das ondas

 

sexta-feira, dezembro 10, 2004   

 

 

Móvel e imóvel
como a
ave que voa e
a sombra dela
assim somos nós

 

 

 

 

Na polpa dos teus olhos
sobem lagos

e as aves inclinam-se
alisando as penas

 

sexta-feira, dezembro 03, 2004   

 

 

Passeio dos Prodígios
(Jorge Palma)

Vamos lá contar as armas
tu e eu, de braço dado
nesta estrada meio deserta
não sabemos quanto tempo as tréguas vão durar...

há vitórias e derrotas
apontadas em silêncio
no diário imaginário
onde empilhamos as razões para lutar!

Repreendo os meus fantasmas
ao virar de cada esquina
por espantarem a inocência
quantas vezes te odiei com medo de te amar...

vejo o fundo da garrafa
acendo mais outro cigarro
tudo serve de cinzeiro
quando os deuses brincam é para magoar!

Vamos enganar o tempo
saltar para o primeiro combóio
que arrancar da mais próxima estação!
Para quê fazer projectos
quando sai tudo ao contrário?

Pode ser que, por milagre,
troquemos as voltas aos deuses.

Entre o caos e o conflito
a vontade e a desordem
não podemos ver ao longe
e corremos sempre o risco de ir longe demais

somos meros transeuntes
no passeio dos prodígios
somos só sobreviventes
com carimbos falsos nas credenciais.

Vamos enganar o tempo
saltar para o primeiro combóio
que arrancar da mais próxima estação!
Para quê fazer projectos
quando sai tudo ao contrário?

Pode ser que, por milagre,
troquemos as voltas aos deuses.

Vamos enganar o tempo...

 

 

 

 

das minhas mãos soltam-se os rios
que vão cantar longe
noutro lugar cavar seu leito

não guardei a água do meu charco
do banho de leite só retive o cetim
e a garganta aperta-se
sobre a turva espuma
para que os olhos fiquem claros

 

 

pergunta-me [se te apetecer]

parece que foi ontem:

pronto, já passou:

os outros:

procura [se te apetecer, também]