flashback

 

um dia, melhor, uma tarde, reparou que só um enorme silêncio acontecia. de repente não havia mais nada. nem mãos no cabelo. nem gestos. nem dedos. nem cumplicidades.
de repente era como nos dias da infância. como naqueles em que já não havia ninguém para além da mãe que escondia as lágrimas enquanto estendia os lençoius no quintal. tudo em silêncio. foi então que ela aceitou que ele já não estava interessado. que o silêncio dele, a ausência dele, a ausência dos gestos dele, essas coisas assim, mais não eram do que uma maneira de acabar o que nunca tinham começado.
um dia apercebeu-se que ele tinha combinado outras coisas. com pessoas muito mais legítimas e compreensivas, e assim. e então ela foi à varanda para escorraçar as lágrimas. ele não fez como nos filmes. não foi atrás dela para a abraçar. também não a chamou quando ela foi embora. por isso, nos dias seguintes, foi o que não se viu.
ela pensava: ainda se ele gostasse muito de mim. muito, a ponto de me dar a mão na rua. de me abraçar na rua. de me levar com ele pelos dias sem ser só pelos fins de tarde.
um dia ele ficou em silêncio e ela não conseguir dormir com a ausência. ela descobriu que afinal, por mais que tentasse fugir, não conseguia deixar de sofrer. gostar é assim. um caminho para o desencontro.
por muito tempo, para o costume, nenhuma palavra foi dita. nenhuma palavra.

 

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