ela não via a chuva. só ouvia. como se em todo o lado chovesse mas não nesta parte riscada da memória.
ele às vezes vem junto dela. aproxima-se dela. muito. segura-lhe o rosto entre as mãos. um afago, uma ternura. às vezes as mãos ficam molhadas. olham-se. calam-se. ambos têm grades.
a obscuridade aumenta. ele e ela distinguem-se cada vez menos na obscuridade. vultos no paredão do rio. medo. apenas o som das redes a serem lançadas à água. grades atavam-lhes o coração.
ela escrevia. pequenos textos como um retornar diurno dos percursos que fez com ele pela noite.
à noite ele ia com ela. a principio distante e silencioso mas depois, junto ao rio, ficava assim, quase feliz. abraçava-a muito. nunca disse o que sentia. nunca disse. por momentos ele tem um ar feliz. depois lembra-se de outros compromissos, de outro rosto, de outro corpo e fica assim num silêncio atormentado.
o som das redes a serem lançadas ao rio. música que sai esbatida dos bares mais próximos.
alguns dias ele apenas diz até amanhã mas olha-a como se já a tivesse perdido.

 

 

pergunta-me [se te apetecer]

pronto, já passou:

os outros:

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