...e inventaram o amor com carácter de urgência...
«Em todas as esquinas da cidade
Nas paredes dos bares à porta dos edifícios públicos nas janelas dos autocarros.
Mesmo naquele muro arruinado por entre anúncios de aparelhos de rádio e detergentes.
Na vitrine da pequena loja onde não entra ninguém
No átrio da estação de caminhos de ferro que foi o lar da nossa esperança de fuga
Um cartaz denuncia o nosso amor.
Em letras enormes do tamanho
Do medo da solidão da angústia
Um cartaz denuncia que um homem e uma mulher
Se encontraram num bar de hotel
Numa tarde de chuva
Entre zunidos de conversa
E inventaram o amor com carácter de urgência
Deixando cair dos ombros o fardo incómodo da monotonia quotidiana.
Um homem e uma mulher que tinham olhos e coração e fome de ternura
E souberam entender-se sem palavras inúteis.
Apenas o silêncio. A descoberta. A estranheza
de um sorriso natural e inesperado.
Não saíram de mãos dadas para a humidade diurna.
Despediram-se e cada um tomou um rumo diferente
Embora subterraneamente unidos pela invenção conjunta
de um amor subitamente imperativo. (...)»
excerto do poema 'A Invenção do Amor', Daniel Filipe
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